1.3.12

Felicidade Clandestina [Parte II]


"Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só pra depois ter o susto de o ter."
  A oportunidade surgiu quando pensei em fazer amizade com a dita cuja. Haveria de ser difícil, já que não fazia o gênero nem o tipo de pessoa que ela estava acostumada a ter como amiga. E cá entre nós, não posso ser hipócrita de dizer que não era uma menina bonita, se não era, perto dela me tornava uma princesa. Podia a gordinha ser dona do meu paraíso, mas sua imagem era de dar pena. Talvez pra compensar a sua falta de beleza, pisava nas pessoas fingindo-se conhecedora de inúmeros assuntos que segundo ela, havia aprendido ao ler os livros da iluminada biblioteca. Dava-me raiva vendo-a destilar sua crueldade sabendo de minha ânsia, fingindo dar importância aos volumes quando nem deveria entrar na imensa sala onde eles estavam.

  O fato é que me aproximei e engolindo meu orgulho pedi emprestados alguns títulos que há muito me interessavam. E ela soprava uma brisa de esperança me prometendo os emprestar, pra depois inventar mil desculpas. Primeiro os esqueceu na mesa, depois os colocou em outra das muitas mochilas que tinha, num outro dia o pai a teria proibido de emprestar seus livros. Isso quando não inventava ter emprestado a primos, vizinhos e outros amigos. Eu abafava minha raiva, e em pensamento acreditava que a justiça seria feita.  


Fui à casa da malvada e na sua ausência, pedi à mãe, que eu não conhecia, mas que diferente da filha tinha ares de gente humilde. Perguntei-me de onde havia tirado a menina tanta feiura e maldade, já que a bela mãe não somente me entregou os títulos que eu tanto queria e ainda deu-me acesso á biblioteca particular sempre que quisesse. Obviamente isso não agradou a filha, mas a mim isso não interessou muito. A justiça havia chegado e minha felicidade agora era visível. Meus olhos foram alimentados, minha fome de ler por muito tempo sendo saciada naquele paraíso que hoje, depois de tanto tempo eu pude copiar e fazer pra mim.
{Ana Lara Trindade e Caroline Lina.}
Postado por Clarice Lispector às 19:18

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